domingo, 8 de junho de 2008

O Cinema como estopim de muitas revoluções

Por Ana Cristina Coelho (Editoria de Cinema)

Um apaixonado por cinema poderia muito bem dizer que os "eventos de Maio", as greves e tumultos que sacudiram a primavera de 1968, na França, começaram no cinema. No dia 9 de fevereiro, o visionário colecionador de filmes, Henri Langlois, que fundara a Cinemateca Francesa em 1936, foi removido de sua posição de presidente da instituição por Andre Malraux, ministro da cultura do governo de Charles de Gaulle. Porém, o tal Langlois era considerado por muitos cinéfilos e cineastas estreantes, pai espiritual da Nouvelle Vague. Em suas sessões de filmes de arte, filmes proibidos e filmes originais, ele criou o primeiro templo para os amantes do cinema de autor. Imediatamente François Truffaut decretou: "Defender a Cinemateca é um ato político!". Alguns dias depois, em 14 de Fevereiro de 1968, três meses antes do fatídico "Maio de 68", a Polícia de Intervenção Francesa reprimiu uma manifestação de milhares de pessoas, incluindo personalidades do cinema como Jean-Luc Godard, Truffaut, Catherine Deneuve ou Jeanne Moreau, que na ocasião, tentavam chegar ao Palácio Chaillot, sede da Cinemateca, para apoiar Henri Langlois, o famoso "Monsieur Cinema".

Em Maio, a França estava repleta de motins, greves e manifestações de massas, e os cinéfilos continuavam todos do mesmo lado da barricada. Algumas das tradições e instituições mais veneráveis da França pareciam estar sob ataque, e o Festival de Cannes, o charmoso evento da primavera, também não ficaria imune. O burburinho começou no dia 13, quando os cineastas Jean-Luc Godard, François Truffaut e Claude Lelouch chegaram à 21ª edição do evento para espalhar o espírito da revolta que acontecia em Paris desde o início daquele mês. Em 18 de maio, quando o longa de Carlos Saura "Peppermint Frappé" seria exibido na disputa pela Palma de Ouro, um protesto de cineastas cancelou a sessão e o próprio diretor pediu aos organizadores que não exibissem seu filme para que o cinema "deixasse a revolução passar". No dia seguinte, o festival estava oficialmente cancelado, sem que houvesse premiação. Foi a única vez em que uma edição do festival foi interrompida antes do fim. Eram os gritos de protesto que tomavam as ruas de Paris no Maio de 68 ecoando em Cannes. O filme de François Truffaut "Baisers Volés" ("Beijos Roubados"), rodado neste mesmo conturbado ano, acabaria por ser dedicado à crise na Cinemateca Francesa, tendo com plano inicial a entrada do Palácio Chaillot.

Mas, não foram somente as revoluções de rua que aconteceram em 1968, o ano seria ainda marcado pelas revoluções na estética cinematográfica, e o filme "2001, Uma Odisséia no Espaço" de Stanley Kubrick, inaugura em abril esse novo cenário. O filme, escrito a quatro mãos com o escritor de ficção científica Arthur C. Clarke, prevê não só a chegada do homem a lua que se daria um ano depois, como também é o primeiro filme a levantar a hipótese da Inteligência Artificial. Considerado por muitos o melhor filme de ficção-científica de todos os tempos, trouxe avanços nas técnicas de filmagem, criando o conceito de steadicam, em que um cinegrafista carrega uma pesada câmera Panasonic, para dar realidade às cenas de tensão. O filme fez um sucesso enorme entre os jovens da época e atribui-se tal sucesso às imagens psicodélicas nas seqüências do túnel de luz, a viagem mais próxima do LSD, droga muito consumida na época.

Outro terremoto ainda estaria para acontecer no final do idílico verão europeu deste mesmo ano, agora no Festival de Veneza. O mais que arrebatador "Teorema" de Píer Paolo Pasolini provou uma enorme polêmica ao ser lançado, chocando as platéias do mundo inteiro ao mostrar uma alegoria da volta do "messias" em forma de falo. O belíssimo Terence Stamp faz o papel de enigmático Jesus Cristo, que aqui é anunciado como estranho pelo carteiro, em vez de por anjos. O "estranho" transa com todos da casa, a mulher, o marido, o filho, a filha, a empregada. Todos, depois de se relacionarem com ele, mudam radicalmente de vida. E numa crítica impiedosa à sociedade burguesa, nenhuma pessoa com valores individualistas e frívolos conseguiu sobreviver ao "amor" de Cristo, apenas a doméstica, como representante do povo, é capaz de redenção. O filme revoluciona por ser também o primeiro nu frontal masculino da história do cinema e arrebatou o prestigiado prêmio do Office Catholique du Cinéma (OCIC), o órgão católico que premia o cinema. Essa premiação apenas acrescentou uma dose extra de escândalo ao filme. Afinal, Pasolini, notório marxista e homossexual assumido, era também cristão.

Um comentário:

Anônimo disse...

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