Fala-se muito em 1968, nos acontecimentos políticos, culturais e nas mudanças tão significativas que o mundo sofreu, mas e a imprensa da época? O que ela falava e como se mantinha diante disso tudo?
Peguei alguns exemplares de uma das principais revistas da época, a “Realidade”, que atualmente é a “Veja”, para mostrar as diferenças entre notícias, comportamento e visão daquele ano e de hoje.
Revista Realidade: Entrevista com Luis Carlos Prestes – 1ª Parte
Uma reportagem de Paulo Patarra sobre Luis Carlos Prestes é a principal matéria da revista Realidade de dezembro de 1968. Ele descreve como chegou até Luis Carlos prestes, que foi ao encontro de um homem que o levaria até o local da entrevista, o homem vestia chapéu e cachecol e mal era possível ver seu rosto.
Paulo Patarra descreve o clima pesado do encontro, onde foi pedido para que ele fechasse os olhos e foi jogada uma luz de uma lanterna em seu rosto, a luz era forte e esteve acesa todo o tempo em que foi posto dentro de um carro e conduzido, sempre de olhos fechados, até dentro de um prédio, onde o levaram até uma sala onde foi autorizado a abrir os olhos. Estava numa sala com um homem que alguém o avisou ser Luis Carlos Prestes.
A matéria o descreve como um homem “sem rosto” porque havia feito plásticas e mudado de fisionomia ao longo dos quarto anos (1964-1968), e o autor da matéria não tinha certeza se era realmente Prestes, que o tornou ansioso. Após algumas perguntas, o entrevistado lhe pediu calma e sugeriu que eles descansassem por um tempo antes de começarem a entrevista. Depois de algumas palavras, Patarra teve certeza se tratar de Prestes pela sua voz.
A entrevista, que foi cercada de cuidados e desconfianças, começou com perguntas sobre o Partido Comunista Brasileiro, o PCB, e Luis Carlos Prestes se recusava a responder perguntas que pudessem ser respondidas através de provas ou documentos já existentes, mas disse que estava concedendo a entrevista para que fosse mostrado o verdadeiro ponto de vista dos comunistas brasileiros, sem suposições.
O Que Queriam os Comunistas Brasileiros?
Um livrinho de oitenta páginas datado de dezembro de 1967 lhe foi entregue com mais alguns documentos sobre o último congresso do PCB da época. Ele resumia o que propunham os comunistas brasileiros: uma Revolução Política, aprovada no sexto congresso do PCB. A primeira parte tratava da situação e comemorava o qüinquagésimo aniversário da Revolução Russa, enfatizava que grandes movimentos operários travariam batalhas, não citava em quais países, mas ficava subtendido quando apareciam comentários sobre o aumento das tendências à unidade das forças democráticas contra a ditadura franquista.
A posição dos comunistas era dita progressista, enfatizava a importância da posição da igreja católica, que eram contra o capitalismo e favorável à aspiração dos povos ao socialismo. Se admitiam contra os Estados Unidos, reclamavam do seu crescimento econômico e militar e de suas tentativas de oprimir as “Forças Revolucionárias”. Falavam das provocações norte-americanas contra Cuba, denunciavam golpes militares na Alemanha Federal.
Tratava da situação econômica e social do Brasil, citando o avanço das produções industriais a partir de 1948, o crescimento do PIB e o aumento no número de habitantes em 60%. Falava da baixa nos salários da classe operária, envolvia a burguesia colocando-a como interessada na ampliação do mercado consumidor, o ligando diretamente ao movimento nacionalista que favorecia o governo.
Criticava o imperialismo sempre em linguagem dogmática, pregava a necessidade de uma mudança no regime político e tentava provar que o Brasil vivia num sistema ditatorial, com apoio dos norte-americanos. Pregando a necessidade de uma libertação econômica e política do Brasil.
Na situação da época, o objetivo era mobilizar, unir e organizar a classe operária e demais forças patrióticas e democráticas para a luta contra o regime ditatorial pela sua derrota e conquista das liberdades democráticas. Propunha um programa para ser discutido com ênfase na revogação da constituição de 1967, com restabelecimento dos direitos revogados ou violados, libertação dos presos políticos e anistia geral.
Ainda convocava uma assembléia a fim de elaborar uma “constituição democrática”, eleições diretas e livres, além do funcionamento de todos os partidos políticos, inclusive o PCB.
Até ai, a revista parecia estar sendo favorável ao regime capitalista sugerido por Prestes, se esse quadro em que o livro é comentado não fosse concluído com uma comparação entre as propostas da constituição democrática que eles pretendiam fazer, com o ataque dos soviéticos à Tchecoslováquia, que culminou depois do fechamento de todos os partidos de oposição no país, que se sucedeu depois da publicação do livro que defendia o socialismo e o manual das resoluções do IV Congresso Comunista.
No próximo texto, a segunda parte e o fechamento da entrevista com Prestes e o desfecho do lado comunista na visão da “Veja” de antigamente.
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