quinta-feira, 26 de junho de 2008

1968

Por Beatriz Cecchetti (Editoria Mundo)

O conturbado quadro político dos países da América Latina em 1968 era fruto dos laços de dependência econômica que estes ainda mantinham com potências capitalistas. Apesar de já serem independentes no âmbito da política, existiam forças reformistas, nacionalistas e, de extrema esquerda que queriam democracia e autonomia. A onda de ditaduras militares se alastrava na mesma proporção que cresciam os movimentos pró-libertação, reformistas, revolucionários e guerrilheiros.

Conhecida como “Terceiro Mundo”, a América Latina, aos poucos, foi se mostrando tão divergente que, este termo só se servia para distinguir os países “pobres” dos “ricos” de acordo com seu PIB - Produto Interno Bruto.

Segue, abaixo, um breve resumo do que acontecia nos principais países da América Latina.

Na Argentina, desde 1966 após um golpe de Estado, o general Juan Carlos Onganía assumiu a presidência. Seu governo teve inúmeras crises, principalmente dentro do próprio Exército.

A Bolívia teve na época, um presidente ditador que ao mesmo tempo, era revolucionário, René Barrientos Ortuño. Esse mesmo presidente mandou matar Che Guevara, em 1967.

Em 1968, no Chile, Eduardo Frei Montalva, após ter vencido Salvador Allende nas eleições de 1964, governava. Ele era democrata cristão e teve apoio da CIA em sua campanha anti-esquerdista. Foi sucedido por Allende após o golpe de Pinochet em 70.

Carlos Lleras Restrepo, tentou implementar na Colômbia uma política reformista, conhecida por “Transformação Nacional” cujo foco era em políticas econômicas, sociais e culturais. Era liberal - chegou até ser presidente do partido – e só saiu do seu cargo de presidente da Colômbia em 1970 com o golpe do general Rojas Pinilla.

Osvaldo Dorticós Torrado foi o último presidente de Cuba antes de Fidel Castro. O comunista foi quem anunciou, em um encontro das Nações Unidas, que Cuba possuía armas nucleares.

No Paraguai, presidia o general Alfredo Stroessner Matiauda – militar mais jovem que já recebeu a patente de general na América do Sul. Após dar um golpe, ficou no poder por 7 mandatos consecutivos. Boicotou Ronald reagan e asilou em seu país ex-nazistas. Morreu exilado no Brasil em 1989.

No Peru, uma junta militar liderada por Juan Velasco Alvarado toma o poder e toma algumas medidas. Dentre elas: nacionalização quase que completa da economia, reforma agrária, igualdade das mulheres, autonomia das universidades, censura e controle dos meios de comunicação. Alvarado, que possuída ligações estreitas com a URSS, é deposto em 1975.

O uruguaio Jorge Pacheco Areco, na tentativa de fugir do imperialismo norte-americano, implantou medidas de segurança, prendeu dirigentes sindicais e assassinou estudantes. Teve um governo marcado pela barbárie.

Raúl Leoni Otero era democrata e lutou contra qualquer tipo de ditadura na Venezuela. Inaugurou a hidrelétrica de Guayana, o Banco dos Trabalhadores e, fez reformas importantes nas leis sociais e trabalhistas.

E, no Brasil, estávamos sob a ditadura do marechal Artur da Costa e Silva. Nesse momento começou a fase mais dura da ditadura brasileira, que o general Médici deu continuidade. Dentre outras medidas, o então presidente promulgou o – famoso – AI-5, que lhe dava poder para fechar o Congresso Nacional, cassar políticos e insitucionalizar a repressão.

O Fracasso de Annuska

Por Isabela Kastrup (Editoria de Cinema)

Annuska, manequeim e mulher, filme brasileiro de 1968 que marcou a estréia do diretor e roteirista paulistano Francisco Ramalho Jr., foi um verdadeiro fracasso de público e de crítica. Baseado num conto de Ignácio de Loyola Brandão, intitulado Ascensão ao mundo de Annuska, que está no livro Depois do Sol, o filme narrava a história de uma bela moça, Annuska (Marília Branco), aspirante à carreira de modelo, que troca seu amante de meia-idade, Bernardo (interpretado por Francisco Cuoco), pelo jovem e belo Sabato (interpretado por Ivan Mesquita).

O filme, que teve Loyola Brandão atuando como roteirista, marcou a estréia do ator José de Abreu na telona, fazendo um papel minúsculo, foi o primeiro trabalho da empresa de produção cinematográfica Tecla, que reunia nomes expressivos do cinema brasileiro, como João Batista de Andrade, Francisco Ramalho Jr., João Silvério Trevisan e Sidney Paiva Lopes.

Em texto autobiográfico e de memórias, intitulado Uma trajetória particular, o cineasta João Batista Andrade conta que Annuska surgiu numa época em que o mercado de cinema no Brasil (no final dos anos de 1960) tinha uma estrutura obsoleta e pouco inovadora. Os circuitos eram dominados pelo cinema norte-americano, até mesmo pela ausência de uma produção brasileira contínua, que fosse capaz de ocupar e garantir a ocupação das salas nas capitais e no interior.

Nessa época, João Batista já amargava a censura de seu filme Liberdade de imprensa pela ditadura militar: ao ser exibido no Congresso da UNE em 1968, foi apreendido pelo Exército e proibido em todo o território nacional.

Como as novelas faziam estrondoso sucesso de público na época (basta lembrar O direito de nascer), o grupo de cineastas da Tecla resolveu apostar num filme estrelado por Francisco Cuoco, galã das novelas que tinha popularidade impressionante. O plano era ganhar dinheiro com um filme mais comercial, Annuska e assim angariar recursos para que João batista de Andrade pudesse fazer o seu filme, mais político. Mas o tiro saiu pela culatra. Conta João Batista de Andrade:

“Ramalho achava que o projeto teria tudo de "comercial", ainda mais com o Francisco Cuoco, e que com o dinheiro da renda conseguiríamos fazer um outro projeto - o meu, mais político, com forte influência do Cinema Novo e do cinema do italiano Francesco Rosi (Ma no su la citá, O bandido Giuliano, O caso Mattei etc.). O resultado, aliás bastante comum nesse tipo de projeto, foi no mínimo péssimo, a ponto de o ator, que se tornara sócio do filme, desconfiar da seriedade de nossas contas. Mas as contas eram verdadeiras e o Anuska sequer se pagou. Isto é, não se transferiu para o filme o prodigioso sucesso do ator”.

Esse tipo de tentativa – aproveitar o sucesso da TV para alavancar sucessos no cinema nacional deu certo em muitos outros casos, como, por exemplo, A dama do lotação, de Neville deAlmeida, que explorou a nudez de Sônia Braga e deu ótima bilheteria, apesar de mal recebido pela elite formadora de opinião, que considerou o filme meramente pornográfico.

O fracasso do filme foi, de qualquer forma, um resultado da atmosfera pesada e opressiva dos anos de chumbo.

O cineasta Francisco Ramalho Jr., em foto recente.

O diretor João Batista de Andrade (ao centro) nas gravações de Mercúrio no pão de cada dia (1976), produzido para a TV Globo.

Um ano no meio do Cinema Novo

Por Karina Rocha (Editoria de Cinema)

O ano de 1968 foi de repressão em todos os sentidos e isso não é nenhuma novidade. Assim sendo o cinema não ficou de fora e o movimento “Cinema Novo” que tinha se iniciado em 1952. O movimento primava por um cinema com mais realidade, mais conteúdo e um menos custo em comparação às grandes companhias cinematográficas.

O ano de 68 foi um divisor de águas para o movimento, pois separa a segunda da terceira fase deste processo.

O Cinema novo já estava em sua segunda fase, onde o propósito passou a ser analisar a política e a ditadura militar, foi a estréia de O Bravo Guerreiro, de Gustavo Dahl.

Daí em diante entra a fase tropicalista, terceira no Cinema Novo, e de grande representatividade nacional. Era a hora de extravasar, não se importar com conseqüências e encarnar o verde-amarelo.

O grande marco desta nova fase é Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade, que estréio no ano seguinte, 1969.

Mais uma vez a repressão veio, deu fim ao movimento, e inúmeras produções foram fracassos comerciais.

O “GRANDE TEATRO” DE 1968 – Com Foco Em Zé Celso Martinez Corrêa

Por Brunna Condini (Editoria de Teatro)

O Teatro, como várias outras expressões artísticas, foi sufocado pelos acontecimentos políticos e transformações sociais de 68. O Ato Institucional número 5 baniu os ensaios de socialização da cultura no país. O Teatro mais artístico se refugiou nas pequenas companhias, com pouco dinheiro e pouco público.

Em 1968, o autor e diretor, estava no auge do desenvolvimento da linguagem de sua companhia. O Teatro conheceu um movimento arrebatador que não sobreviveria à tanta repressão.Participou desse período com o mesmo gás, o Teatro Arena,de Augusto Boal. Ambos tiveram que se exilar, mas isso não abalou a dedicação em criar uma dramaturgia própria, totalmente brasileira. Bons profissionais surgiram de seus trabalhos. Fincaram a história do Teatro no país.Ambos foram violentamente interrompidos pelo AI-5.

Formou, em 1958, um grupo de teatro amador, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, que daria origem ao Teatro Oficina, marcado pelo compromisso de fazer uma obra de caráter inovador. Entre suas mais famosas montagens estão como Quatro num quarto, de Valentin Kataiev, e Andorra, de Max Frisch, dirigidas por ele e por Carlos Queiroz. Em 1967, com a montagem da peça O Rei da Vela, de Oswald de Andrade passou a desenvolver-se e expressar-se através do espetáculo-manifesto. Foi duramente censurado e acabou indo para o exílio.

Em 1970 vivenciou todas as experiências da contracultura. Era um líder de sua comunidade teatral e diretor das montagens com criações coletivas. Em 1990, ressurgiu com o Oficina,conectado ao tempo e conectando constantemente vida e Teatro. Reinventou-se.

Nos anos 90, o Oficina voltou a atuar em São Paulo sob o seu comando, com nova organização,mas procurando manter a mesma linha teatral com projetos como Boca de Ouro, de Nelson Rodrigues e, mais recentemente a epopéia de Os Sertões de Euclides da Cunha que retrata o episódio da Guerra dos Canudos. Entre outras peças de destaque em que dirigiu, pode-se citar Pequenos burgueses, de Maksim Gorki (1963) e Roda Viva, de Chico Buarque (1968).

Teve como colaboradores nomes que também são verdadeiros marcos na história teatral brasileira,como Renato Borghi,Fauzi Arap,Célia Helena,Eugenio Kusnet, e também uma privilegiadíssima atuação de Henriette Morineau em Todo anjo é terrível,de Ketti Frings,em 1962.

"Durante cerca de uma década, década excepcionalmente efervescente, José Celso foi, provavelmente, a personalidade criativa mais forte do teatro brasileiro; foi, em todo o caso, o encenador mais aberto a idéias ousadas e sempre renovadas, capaz de realizar, a partir delas, espetáculos surpreendentes, generosos, provocantes, excepcionalmente inventivos. Sua atuação, nessa época, marcou não só o teatro nacional - Pequenos Burgueses, O Rei da Vela e Na Selva das Cidades, pelo menos, têm lugar garantido e importante na História desse teatro - como também a arte brasileira em geral. Durante esse tempo, ele foi um divisor de águas, um ponto de referência e uma fonte básica de influências".
(Yan Michalski – Fala sobre a importância hegemônica de Zé Celso durante a década de 60)

Zé Celso e toda memória do Oficina, ficaram exilados de 1974 a 1978. Poucas vezes, viu-se um artista “possuído” desta maneira. Seu estilo único, sua maneira brasileira de buscar o mais brasileiro dos teatros, tudo isso fez de Zé Celso, um ícone. Responsável por um divisor de águas, histórico e criativo. Autor, diretor e ator, era e continua sendo,um operário do ofício.Um dos mais talentosos e originais diretores do momento e segundo alguns críticos, a mais perfeita encenação stanislavskiana do teatro brasileiro. Irreverente, irresistível e resistente. Em 2008, quarenta anos depois, José Celso Martinez Correia, ainda tem seu Teatro Oficina e continua resistindo.

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Romeu e Julieta, a eterna história de amor que temperou 1968

Por Ana Cecília Abreu (Editoria de Cinema)

Os tempos turbulentos de 1968 deram um impulso extra à suavidade, à delicadeza e à profundidade com que o cineasta italiano Franco Zefirelli trouxe a público a história de amor escrita por William Shakespeare e eternizada no imaginário de todas as gerações. Na verdade, essa era a hora certa para que os jovens de então suspirassem e encharcassem lenços de tanta emoção com a história de intolerância, resistência, paixão, amor e morte vivida pelo casalzinho na Verona renascentista.

Um amor que ultrapassou as, até então, inexpugnáveis barreiras da guerra declarada dos clãs inimigos: Capuletos X Montecchios. Os dois apaixonados foram capazes de tudo para viver seu sonho. E mostraram para a sociedade que mesmo mortos, estavam vivos em seu sentimento indestrutível.

As palavras de Shakespeare foram respeitadas, o texto foi praticamente todo mantido, com o vocabulário da época. Os dois protagonistas foram lançados nesse filme e eram tão jovens quanto seus personagens: Leonard Whiting, o Romeu, tinha 17 anos e a então estreante Olívia Hussey, era uma menina de apenas 15 anos.

Foi surpreendente o que esse filme representou para toda uma geração que vivia assustada com os movimentos reivindicatórios que pipocavam por todo o mundo. A grande revolução de costumes que se operava deu espaço para a representação mais clássica de um tema eterno: o amor entre um homem e uma mulher. E não foi só isso: a produção extremamente bem cuidada, com muitas externas em igrejas e prédios de época de cidades italianas, os demais cenários, os figurinos, a trilha sonora perfeita assinada por Nino Rota, tudo colaborou para que o filme criasse no espectador uma sensação de estar vivendo com os personagens aqueles momentos.

Aqui no Brasil, por exemplo, o filme Romeu e Julieta representou uma válvula de escape necessária para aliviar das tensões e medos constantes. Uma população que vivia sobressaltada pela supressão da liberdade de expressão e de muitos direitos individuais tinha mesmo a necessidade de vivenciar sentimentos diferentes. Nesse contexto, a obra de Zefirelli a partir da obra shakesperiana foi uma alternativa de altíssimo nível.

O filme recebeu quatro indicações para o Oscar de 1969 (diretor, filme, fotografia, figurinos), tendo vencido nas categorias figurino e fotografia. Leonard Whiting e Olívia Hussey receberam os prêmios de revelação masculina e feminina do Globo de Ouro de 1969, sendo que o filme também recebeu indicação nas categorias diretor, melhor filme estrangeiro, trilha sonora.

Todo o sucesso e os prêmios obtidos por essa peça chave do cinema europeu era alvo de crítica da parcela mais engajada politicamente, que desdenhava de quem suspirava com a cena do balcão, ou se emocionava com a imagem (ousada para a época) de Romeu, nu, evidenciando que os dois jovens tinham concretizado seu amor (sob as bênçãos ocultas de Frei Lourenço). Era como se, em tempos de AI 5, prisões e perseguições políticas, não pudesse mais haver espaço para o sonho, para o amor, para o sentimento.

Mas o jovem comum, no fundo, sentia a carência desse sonhar próprio da idade. Por isso houve tão grande identificação e aceitação por parte do público. Um amor que vencia até a própria morte, era tudo de que o povo precisava então.

Romeu e Julieta foi um clássico da literatura inglesa que, através do talento de Franco Zefirelli penetrou na realidade e no imaginário de milhões de pessoas em todo o mundo e, aqui no Brasil, causou enorme comoção.

Ficha Técnica:

Romeu e Julieta
(Romeo and Juliet, Inglaterra, Itália, 1968)

Títulos Alternativos: Romeo e Giulietta
Gênero: Drama, Romance
Duração: 138 min.
Tipo: Longa-metragem / Colorido
Distribuidora(s): CIC Vídeo, Paramount Pictures do Brasil
Produtora(s): BHE Films, Dino de Laurentiis Cinematografica, Verona Produzione
Diretor: Franco Zeffirelli

“DOCUMENTÁRIO” - Rogério Sganzerla, Brasil,2007

por Claudia Elias (Editoria de Cinema)

16 mm – 11 min – Preto e branco

“Uma câmera na mão, uma idéia na cabeça” e um ano que não nos sai da cabeça.

Definindo...Rogério Sganzerla é um cara do cinema marginal. Cinema marginal foi um movimento que tentou fugir do paradigma da linguagem cinematográfica americanizada e levantar a bola da cultura brasileira, ou ainda, tentar inaugurar outros tipos de linguagem, inovar: “Uma câmera na mão, uma idéia na cabeça” – esse era o lema da galera que curtia, que fazia e que queria um cinema por assim dizer n a c i o n a l.

Rogério realizou seu primeiro curta-metragem de ficção, que contraditoriamente chamou de “Documentário”. Embora o ano em questão aqui seja o 68, e o curta em questão seja de 67, sua análise é extremamente rica, já que faz um “istântaneo” , um “frame” como se diz em cinema e abre uma janela para sabermos como se comportava e o que andava pensando a juventude pré-68. Uma “galera” que estava cansada do imperialismo cultural e sem horizonte...

Cenas que mostram “dois jovens andando por aí sem ter muito o que fazer ...” assim estão descritos os dois jovens do filme nas variadas sinopses. Na verdade são dois amigos andando pelas ruas, tentando ver alguma novidade nos cinemas e não havia nada de novo, tudo uma mesmice.

Eles andam em busca da sessão de cinema perfeita para passar o tempo e fugir da própria falta de possibilidades, tão latente devido ao momento político da época. Aí está o elo com 68, logo nos frames podemos ler no jornal “Subversão está voltando”.

Na verdade, o curta em questão, trata-se de finíssimo material no que tange à sua constante referência ao “anti-filme”, recheado de sarcasmo em relação à narrativa clássica. .O travelling sem trilhos, a “câmera na mão”, a filmagem com luz natural e a pequena equipe causando esse efeito de espontaneidade fazem de “Documentário” um filme essencial para se compreender, não o cinema de 68, mas seus cineastas.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

1968 - O Ano que Acabou

Pela Editoria de Música

O ano de 68 marcou a ruptura de toda uma juventude frente aos valores paternalistas da sociedade, assim como nas questões políticas e de cunho comportamental. A arte também passou por um processo de questionamento e formatação levando a novas formas de linguagem e assim ao surgimento de expressões artísticas de vanguarda.

Paris foi um dos principais cenários dessa movimentação revolucionária que se alastrou pelo mundo. Em março de 68 o reitor da Universidade de Nanterre, em Paris, instituiu uma norma proibindo os rapazes de visitarem as moças em seus dormitórios, a represália não foi bem aceita por alguns alunos que se organizaram e invadiram a secretaria da escola. A reitoria suspende as aulas e chama a polícia. A partir daí a juventude parisiense desperta e as manifestações se estendem à classe baixa, culminando – em 20 de maio – na greve de 10 milhões de operários.

Nos Estados Unidos foi o ano da liberação sexual, do fortalecimento do movimento feminista em paralelo com a liberação da pílula anti-concepcional. Foi o período da afirmação da mulher na sociedade, também da contracultura com o movimento hippie levando uma juventude a negar os valores de seus pais e buscar seus próprios ideais. Sessenta e oito coincide também com a Guerra do Vietnã; o musical Hair nos palcos da Broadway; a indústria cinemátografia promovendo um longa-metragem da banda The Doors. Foi o período do sexo, drogas e rock’n’roll n’um país que tentava exercer sua supremacia bélica frente a União Soviética dividindo o mundo em duas esferas: a socialista e a capitalista.

No Brasil uma ditadura se configurava após o Golpe de 64. E em março de 68 a revolução tem como estopim o assassinato do estudante Edson Luís, morto pela polícia durante um protesto em frente ao restaurante universitário ‘Calabouço’. Meses depois ocorre a ‘Passeata dos Cem Mil’ levando mais de cem mil pessoas às ruas do Rio de Janeiro exigindo a diminuição da repressão e a redemocratização. Surge então o CCC(Comando de Caça aos Comunistas) e se institui o AI-5(Ato Institucional 5) a fim de conter as manifestações e a disseminação de qualquer ideal “libertador”.

No campo da cultura observamos – 10 anos após a invenção da Bossa Nova – o nascimento do Movimento Tropicalista que mesclava manifestações tradicionais da cultura brasileira com novas linhas estéticas. A Tropicália foi representada por grandes nomes da música brasileira como Caetano, Gil, Tom Zé, Os Mutantes e outros. Foi também o ano da peça Roda Viva de Chico Buarque, altamente repreendida pelo regime militar e do lançamento de um dos maiores discos da história: o ‘Álbum Branco’ dos Beatles – precedido de outro clássico da banda inglesa, o álbum ‘Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band’ considerado uma obra-prima.

É incrível como tantos acontecimentos relevantes se deram nesse ano de 68. Acontecimentos com transformações que estão presentes até os dias de hoje em nosso way of life, 40 anos depois. Zuenir Ventura afirma que 68 é o ano que não terminou, mas será mesmo? Realmente é inegável a influênca de 68 para a formatação da sociedade atual, mas porque não vemos, hoje, a movimentação que se via naquele ano? Afinal, somo os filhos de uma geração revolucionária que clamava por mudanças, tentando construir um futuro melhor. Será que a geração de 68 conquistou o futuro com o qual sonhava para seus filhos? Infelizmente me atenho a constatação do intelectual francês Edgar Morin que afirmou: “Não bastasse a ilusão de que esse crescimento da economia resolveria os problemas, eis que agora impera a estagnação. O mal-estar está mais profundo, inclusive nas classes que têm acesso ao consumo. E quando não há mais futuro, a gente se agarra a um presente desprovido de sentido ou ao passado -nação e religião.”

Tropicalismo

Criação conjunta de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Mutantes, Gal Costa etc. Liderado por Caetano e Gil, teve como participantes Torquato Neto, Capinam e Nara Leão (no disco “Panes et Circenses”, de 1968), além dos arranjadores paulistas Rogério Duprat e Júlio Medaglia, vindos do campo da música erudita de vanguarda para a música de massas.

Atuando no contexto de MPB e dos festivais marcados pela valorização da música nacional, as canções tropicalistas incorporam todos os ritmos e adicionam novos elementos – polemicamente a guitarra, símbolo do pop e do rock – a fim de espantar a influência estrangeira no Brasil. Foi um movimento artístico e musical, e não um gênero da música brasileira ao mesmo tempo em que a Bossa Nova é uma vertente do samba. Os gêneros se configuram em: do samba de roda ao bolero urbano, do repente nordestino à música de vanguarda e do frevo à Jimi Hendrix.

Em contraste com as canções de protesto – que anunciam o “dia que virá”, da justiça social baseadas no samba ou na moda da viola, procurando corresponder a um ideal de identidade cultural originado em raízes nacionais – o movimento tropicalista expõe gritantemente as incongruências do moderno e do arcaico, do nacional e do estrangeiro, da cultura de elite e da cultura das massas.

Há uma paródia em relação aos gêneros musicais. A intervenção nos registros sonoros e poéticos é um procedimento constante. Provocou muita controvérsia no campo comportamental, ao atuar de forma agressiva sobre os hábitos ligados ao corpo, ao sexo, ao vestuário e ao modo estético.

O nome vem do título da canção “Tropicália”, de Caetano, extraído de uma instalação do artista plástico Hélio Oiticica. Foi composta sob o impacto do filme de Glauber Rocha, “Terra Em Transe”, além de ter afinidades com a encenação de “Rei da Selva”, de Oswald de Andrade”, por José Celso Martinez Corrêa. O movimento recebeu apoio crítico da poesia moderna paulista, formado por Augusto de Campos, Haroldo de campos e Décio Pignatari, com o qual dialogou.

Áreas de atuação: além dos discos, programas de televisão, festivais da canção da TV Record contrapostos intencionalmente a aparições na “Discoteca do Chacrinha” e no programa “Divino Maravilhoso”, da TV Tupi.

O Tropicalismo foi interrompido pelo Ato Institucional número 5 (AI-5), em dezembro de 1968, quando Caetano e Gil foram presos pelo governo militar.

Para concluir, apesar de ter se revelado tão explosiva quanto breve, a Tropicália influenciou grande parte da música popular produzida posteriormente no país. Até mesmo em trabalhos seguintes de medalhões da MPB mais tradicional, como Chico Buarque e Elis Regina, pode-se encontrar efeitos do "som universal" tropicalista. Descendentes diretos ou indiretos do movimento surgiram em outras décadas, como o cantor Ney Matogrosso e a vanguarda paulistana do final dos anos 70. Ou, já nos anos 90, o compositor pernambucano Chico Science, um dos líderes do movimento Manguebeat, que misturou pop, eletrônico, hip-hop, hardcore, com ritmos folclóricos locais, como a embolada. Ou ainda um grupo de compositores e intérpretes do Rio de Janeiro, como Pedro Luís e seu grupo “Pedro Luis e a Parede”.

Tropicália

Compositor: Caetano Veloso

Sobre a cabeça os aviões
Sob os meus pés os caminhões
Aponta contra os chapadões
Meu nariz
Eu organizo o movimento
Eu oriento o carnaval
Eu inauguro o monumento no planalto central
Do país

Viva a bossa-sa-sa
Viva a palhoça-ça-ça-ça-ça
Viva a bossa-sa-sa
Viva a palhoça-ça-ça-ça-ça

O monumento é de papel crepom e prata
Os olhos verdes da mulata
A cabeleira esconde atrás da verde mata
O luar do sertão
O monumento não tem porta
A entrada de uma rua antiga, estreita e torta
E no joelho uma criança sorridente, feia e morta
Estende a mão

Viva a mata-ta-ta
Viva a mulata-ta-ta-ta-ta
Viva a mata-ta-ta
Viva a mulata-ta-ta-ta-ta

No pátio interno há uma piscina
Com água azul de Amaralina
Coqueiro, brisa e fala nordestina e faróis
Na mão direita tem uma roseira
Autenticando eterna primavera
E nos jardins os urubus passeiam a tarde inteira
Entre os girassóis

Viva Maria-ia-ia
Viva a Bahia-ia-ia-ia-ia
Viva Maria-ia-ia
Viva a Bahia-ia-ia-ia-ia

No pulso esquerdo bang-bang
Em suas veias corre muito pouco sangue
Mas seu coração balança a um samba de tamborim
Emite acordes dissonantes
Pelos cinco mil alto-falantes
Senhora e senhores ele põe os olhos grandes
Sobre mim

Viva Iracema-ma-ma
Viva Ipanema-ma-ma-ma-ma
Viva Iracema-ma-ma
Viva Ipanema-ma-ma-ma-ma

Domingo é o Fino da Bossa
Segunda-feira está na fossa
Terça-feira vai à roça
Porém
O monumento é bem moderno
Não disse nada do modelo do meu terno
Que tudo mais vá pro inferno, meu bem

Viva a banda-da-da
Carmem Miranda-da-da-da-da
Viva a banda-da-da
Carmem Miranda-da-da-da-da

Roda Viva

Por Bruno Victorino (Editoria de Teatro)

Se há uma música que ilustra bem o período de 1968, é Roda Viva, de Chico Buarque. Composta em 1967, para a peça de mesmo nome, Roda Viva traz em sua letra e melodia o sentido da vida. A roda na qual o título sugere, refere-se as voltas que o mundo dá, os primeiros versos representam o sentimento de impotência, como se tivesse vezes em que você se questiona como está sua postura diante do mundo.

“A gente quer ter iniciativa / No nosso destino mandar / Mas eis que chega roda vida / E carrega o destino pra lá”.

Este verso então transmite a mensagem ao povo de que não podemos aceitar a imposição de quem quer que seja, temos que construir nossos destinos sem deixar que, a “Roda Viva” o carregue pra lá.

Pesquisando pela internet achei um clip que faz uma montagem maravilhosa sobre cenas e personagens da época com a música de Chico Buarque. O grupo de teatro Parañgaw realizou essa obra prima, que vale a pena dar uma conferida.

Video Clip Roda Viva, de Chico Buarque, representado pelo grupo de Teatro Parañgaw

Jim Clark – o maior nome do automobilismo dos anos 60

Por Renata Brazil e Gustavo Medeiros (Editoria de Esportes)

Na década de 60 o mundo conheceu James Clark Jr., Jim Clark, um dos grandes nomes que o automobilismo já viu.

Jim Clark

Nascido em 04 de março de 1936, em Kilmany, Escócia, já aos 15 anos, mesmo contra a vontade dos pais, se interessou por velocidade. Ainda aos 17 participou de alguns rallys e competições menores e mais tarde, em 1956, aos 20 anos, deu entrada oficialmente na sua carreira automobilística participando de competições regularmente, tendo em junho desse ano participado de sua primeira corrida pilotando um DKW. Clark correu por 2 anos na equipe local, Border Reivers, tendo vencido 18 vezes, correndo com Jaguar D-types e Porsches em eventos nacionais. Ainda nesse ano, conheceu o homem que o tornaria um grande nome do automobilismo: Colin Chapman, dono da Lotus.

Jim Clark pilotando seu Lotus

No comando de uma Lotus Elite, Clark terminou o campeonato em segundo lugar, o que muito impressionou Chapman, que o convidou para pilotar um de seus carros na Fórmula Junior (equivalente à Fórmula 3 hoje). Com a mesma Lotus Elite, em 1959 foi campeão da sua categoria. Em 1960, venceu dois campeonatos da Formula Junior e corria simultaneamente pelas Fórmulas 2 e 1.

Sua estréia oficial na Fórmula 1 aconteceu em 1960 no Grande Prêmio da Holanda, tendo abandonado a prova por problemas na transmissão do carro e terminado a corrida na 42ª posição. Já em 1961, no mesmo GP da Holanda, Clark disputou o segundo lugar com Phil Hill, piloto da Ferrari, tendo impressionado a todos por conta de estar pilotando um carro muito inferior ao de Hill. Ainda assim, terminou a corrida em 3º lugar e correu a volta mais rápida da corrida. Porém, na corrida seguinte, em Monza, envolveu-se em um acidente que ocasionou a morte de um companheiro. Clark não havia conseguido se classificar para o GP de Monza do ano anterior e seria sua primeira corrida no circuito. Porém, logo após a largada, na segunda volta, foi atingido por trás por Wolfgang Von Trips, então líder do campeonato e pole position nesta largada, que com o choque saiu da pista e atropelou os espectadores, tendo ocasionado no total 15 mortes, a sua própria e a de 14 espectadores. Até o fim de sua vida, Clark foi apontado como o grande culpado desse acidente fatal, apesar de ter sempre sabido que a culpa do acidente foi do alemão que, após uma largada ruim na pole, na tentativa desesperada de se recuperar, colocou sua vida em risco.

No ano seguinte, houve a estréia da Lotus 25 que, apesar de pouco testado, mostrou competitividade com Clark em seu comando, mesmo com os problemas de embreagem. Na última corrida da temporada, Clark necessitava somente da vitória par sagra-se campeão mundial pela primeira vez, porém um vazamento de óleo adiou o sonho para o ano seguinte.

O primeiro título

Em 1963, Jim Clark tornou-se o mais jovem campeão da Fórmula 1 da história, sendo posteriormente superado por Emerson Fittipaldi somente em 1972 e por Fernando Alonso em 2005. O espanto geral foi ver que o jovem piloto em dez provas, ganhou e fez a pole position em 7 delas, fora o feito de ter tido 6 das voltas mais rápidas da temporada. Na época, o piloto acumulou 73 pontos, equivalentes a 54 pontos hoje.

Quem vê os números, simplesmente diria que a Lotus tinha um carro astronômico. Porém, a máquina era apenas um pouco melhor que as da concorrência, formada principalmente por BRM e Ferrari. O que fazia de fato a diferença era o braço do piloto escocês.

Em 1964, esperava-se que o ano fosse tão proveitoso para Clark quanto o ano anterior, porém não foi o que aconteceu. Apesar de ter iniciado bem a temporada, Chapman decidiu pôr na pista seu modelo novo, o Lotus 33, o que Clark julgou ser prematuro já que o carro ainda estava em período de testes. Devido a uma sucessão de acontecimentos infelizes, o piloto se via sempre à margem das vitórias nas provas. Até o fim da temporada, Clark não encontrou a sorte e no México, última corrida da temporada, devido a um problema na bomba de óleo do seu carro, Clark viu John Surtees ser campeão naquele ano, tendo sido campeão também nas motos, feito jamais repetido até hoje. Porém, o resto daquele ano não foi de se jogar fora. Jim foi pole em Indianápolis e só não venceu por causa de problemas na suspensão. Mas ele venceu o BTCC (Campeonato Britânico de Carros de Turismo) e no fim daquele ano recebeu a Ordem do Império Britânico das mãos da Rainha Elizabeth II.

Passou o espetacular ano de 1965, onde Jim ganhou a Copa da Tasmânia, a F2 francesa, eventos como o Tourist Trophy, a Corrida dos Campeões, as 200 Milhas de Riverside, 6 das 9 provas de F1 disputadas, sendo assim bi-campeão mundial de Fórmula 1 e ainda foi capa da influente revista “Time”, sendo um dos únicos esportistas que obteve tal feito.

Em 1966, mudaram as regras da F1 e os carros teriam tanques de 3L, porém a Lotus não conseguiu fazer um carro à altura do seu piloto espetacular. Clark sofreu dois acidentes, mas que não o impediram de continuar, nada poderia deter o então chamado “escocês voador”.

Em 1967, Jim promoveu uma verdadeira revolução no automobilismo mundial. Iniciou a temporada com mais um título na Copa da Tasmânia e 5 vitórias e 3 segundos lugares nas 8 provas disputadas a bordo de seu Lotus 33. Na Holanda houve a estréia de seu novo carro, o Lotus 49, equipado com um motor Ford desenvolvido pela Cosworth. Naquele dia a F1 entrava numa revolução, uma mudança em sua história que nem mesmo o espetacular Jim Clark poderia prever. De um oitavo lugar no treino classificatório, Jim fez uma corrida de recuperação espetacular na estréia da parceria. Problemas de desenvolvimento impediram Jim de conquistar seu terceiro título nesse ano e os maiores especialistas diziam que este feito viria no ano seguinte, 1968, porém o destino não quis que as coisas acontecessem dessa forma.

A comemoração de uma vitória em Indianápolis

O ano em que o sonho acabou

Em 1968, o ano já começou com os motores a todo vapor. Sem ter tempo para se recuperar das festas de final de ano, o mundo automobilismo teve seu primeiro Grande Prêmio do ano em 1º de janeiro no circuito de Kyalami, na África do Sul.

Nos treinos, Jim saiu-se melhor que os demais concorrentes e largou na pole, tendo mantido a posição até o final das 76 voltas que constituíam a prova. Naquele início de temporada todos podiam ver que o ajuste do modelo 49 da Lotus e o brilhantismo de Clark tornariam a temporada um agradável passeio para a equipe e seu piloto que facilmente poderia conquistar o título daquele ano, o terceiro de sua carreira.

Diante do brilhantismo de Clark, não havia um apaixonado ou conhecedor do automobilismo que negasse o título de Clark naquele ano. Porém, em 7 de abril de 68, Clark teve que participar do GP da Alemanha de Fórmula 2, por questões contratuais com a Firestone, fornecedora de pneus. Na sétima volta, já na sexta posição devido a problemas com o carro, Jim Clark perdeu o controle da máquina e chocou-se com uma árvore. Sua morte foi instantânea. A causa até hoje não é sabida, porém especialistas dizem que por conta de um pneu traseiro vazio o mundo perdeu um dos maiores pilotos que a história já viu. O campeonato daquele ano foi vencido por Graham Hill. Mais um era tinha chegado ao fim.

Jim Clark revolucionou o automobilismo por conta de sua habilidade e espírito competitivo. Com seu patrão, Colin Chapman, a quem foi fiel até o fim de sua vida, estabeleceu uma parceria de sucesso: um projetava, o outro tornava o projeto espetacular. Seus recordes foram batidos longos anos depois por pilotos incríveis como Ayrton Senna, Alain Prost e Michael Schumacher.

domingo, 15 de junho de 2008

O principal legado de 68 para a literatura foi o questionamento

Por Flávia Vieira (Editoria de Literatura)

Marco Medeiros, professor de Literatura Brasileira na Faculdade de Formação de Professores da UERJ, sintetiza nesta frase, de Rubem Fonseca, o clima entre aqueles que produziam literatura durante os anos de ditadura no país: "Não há nada a temer exceto as palavras". Marco, que também é escritor, publica alguns de seus textos no blog labirintoseamoras.blogspot.com. Nesta entrevista, o mestre em Literatura Brasileira, pela mesma universidade que leciona, desconstrói aquela história de que no campo da literatura não houve nada de muito significativo nos anos de chumbo.

  • Muitos afirmam que, apesar da efervescência cultural dos anos de 1960 e 1970, essas décadas foram pouco produtivas para a Literatura Brasileira. Você reforça ou rechaça essa afirmação?

Discordo completamente dessa afirmação, pois a década de 60 foi marcada pelo amadurecimento de grandes escritores, como: Lygia Fagundes Telles e Clarice Lispector, que vão continuar publicando durante a década de 1960. O livro de contos mais importante da Clarice, Laços de Família, é um livro da década de 60.

Por outro lado, os escritores que surgem nestas décadas vão marcar, com força, o panorama literário. No final da década de 1960 surge o Rubem Fonseca, que abre uma vertente nova na literatura brasileira.

  • Como se caracterizam as obras deste período?

Na década de 60, principalmente nos últimos anos, a nossa literatura começa a ficar mais questionadora. Então, a gente começa a ter personagens extremamente dilacerados no processo inteiro, personagens que o tempo todo estão buscando sua identidade. Nessa década, a literatura começa a abordar as questões urbanas, começa a se importar com o homem das cidades, o homem dilacerado pelo contexto da pós-modernidade urbana, e isso, fica evidente quando a gente pensa na obra do Ruben Fonseca.

  • Qual o papel da cesura nesse período da história da literatura brasileira? Você acha que de algum modo ela mudou o curso da história?

A censura trouxe para a literatura uma redefinição de valores, principalmente em 1968 após o AI-5, quando a gente passa a ter censura prévia. Como esses textos não são livres na produção os autores começam a buscar outros caminhos e estes caminhos são caminhos de protesto. Eu não chego a afirmar que a censura foi importante para a criatividade, pelo contrário, acredito que se a literatura já foi grandiosa com o país vivendo o que viveu, imagine se essas pessoas fossem livres para escrever tudo que elas queriam. Através do literário, muitas coisas que as pessoas não podiam abertamente discutir ganharam força, por ser ficção.

O primeiro livro do Ruben Fonseca, O Caso Morel, foi censurado. Ironicamente, por conta disso o livro tornou-se um best seller dos subterrâneos, as pessoas tinham uma edição do livro e ficavam passando umas para as outras secretamente, porque a obra estava proibida. O livro traz uma frase que marca bem esses anos todos da nossa literatura, principalmente 67 e 68: "Não há nada a temer exceto as palavras".

  • A partir do AI-5, em 1968, o Estado "institucionaliza a tortura". Qual o papel que a violência ocupa nessa literatura urbana, que surge neste período?

O Rubem Fonseca foi o primeiro autor a trazer para a literatura a violência da cidade grande. Suas narrativas contrariam o discurso, dos ditadores, de moralização do país. Por isso, a perseguição aos autores que seguiram esse caminho. Antes a literatura tinha uma postura que as personagens tinham de ser especiais. A literatura contemporânea é uma literatura que traz para a cena o homem comum que, na década de 60, é o homem urbano, cerceado pela violência.

  • E a poesia?

O final da década de 1960 vai ser marcado, na poesia, pelos poetas marginais. Esses poetas eram jovens brasileiros, que ainda não tinham entrado no circuito das editoras e que reproduziam seus textos em mimeógrafos. Foi a chamada geração mimeógrafo. Então, teremos todos aqueles ecos de contra cultura na literatura.

  • A partir da década de 1960, verifica-se uma interpenetração entre a palavra, a música popular e a critica. Podemos pensar a poesia brasileira, quando olhamos para movimentos como o Tropicalismo e a Bossa Nova?

Existem limites. Não posso dizer que, esses movimentos, são essencialmente literários, mas não se pode negar que havia uma questão literária muito forte neles. Há sim uma convivência muito interessante entre a literatura e as outras artes. Podemos pensar num panorama artístico que, por está inserido em uma década de questionamento, a arte questiona os seus próprios limites. Pois tanto a bossa-nova e mais forte o tropicalismo são movimentos que nascem de uma reflexão crítica. O movimento tropicalista apresenta uma reflexão muito expressiva do literário. Por serem movimentos de vanguarda quebram certos limites: a literatura sendo influenciada pela música, a música influenciando a literatura. Basta dizer que: um dos maiores compositores da bossa-nova está entre os nossos maiores poetas, Vinicius de Moraes.

  • 1968 foi um ano que desconstruiu paradigmas, inclusive culturais, em que medida os reflexos deste ano singular podem ser observados na Literatura Brasileira?

A herança mais forte de 68 para a literatura foi o questionamento. Sessenta e oito foi o grande ano de questionar, seja pela juventude francesa e todos os demais acontecimentos é um ano de questionar. Surge, em 1968, uma geração de escritores muito jovens e a literatura brasileira passa, também neste momento, a olhar, com mais respeito, para produção de autores jovens. As mesmas pessoas que produziam literatura estavam, nas ruas, protestando contra a ditadura. A partir daquele ano as nossas artes começam a contemplar uma produção artística de jovens, recém saídos da universidade ou ainda universitários.

Oscar de melhor roteiro original e melhor atriz

Por Giosete Vieira (Editoria de Cinema)

A Katharine Hepburn que morre aos 96 anos cobertos de Oscar de melhor atriz (quatro) e da admiração geral nem sempre foi unanimidade. Bem pelo contrário: para começar, depois de se revelar na Broadway, parecia não fazer nenhuma questão de pôr os pés em Hollywood. Por isso exigiu mundos e fundos da RKO para rodar "Vítimas do Divórcio" ao lado de John Barrymore, dirigida por George Cukor. A companhia aceitou, o filme fez sucesso. Hepburn fez novas exigências salariais para assinar um contrato de longa duração. A RKO aceitou. Isso parecia ser o início de uma trajetória linear de sucesso, idéia que só pôde ser reforçada depois que Hepburn ganhou o Oscar de melhor atriz, já em 1933, com seu terceiro filme, "Manhã de Glória", de Lowell Sherman. Logo a RKO veria que a atriz, embora muito profissional, estava longe de aceitar o figurino hollywoodiano. Gostava de andar sem maquiagem, não dava autógrafos, regulava entrevistas. O que hoje se costuma chamar de franqueza, na época, era tido como arrogância. Com isso, em pouco tempo colocar Katharine num primeiro papel equivalia a praticamente garantir o fracasso de um filme. E o fracasso de "Levada da Breca", a grande surpresa de 1938 nos meios cinematográficos, parecia dar a entender que a carreira da atriz estava terminada. Mas agora ela estava disposta a ir em frente. Comprou os direitos de "Núpcias de Escândalo" e, assim, a possibilidade de escolher o diretor (o mesmo George Cukor, que a lançara em 1931) e o elenco do filme. A produção da MGM foi um sucesso e a relançou como estrela. Spencer Tracy - Talvez outro fator essencial no sucesso que se seguiu tenha sido o encontro com Spencer Tracy, em "A Mulher do Dia" (42), com quem a partir daí ela faria uma dupla de sucesso em oito filmes e que, sobretudo, seria o homem de sua vida. No último filme com Tracy, "Adivinhe quem Vem para o Jantar?" (1967), de Stanley Kramer, ganhou o seu segundo Oscar. Em 1968, repetiria a dose por "O Leão no Inverno", onde encarava um grupo de atores britânicos (Peter O'Toole, Anthony Hopkins, Nigel Terry etc.) e nem de longe passava vergonha. O Oscar final, por "Num Lago Dourado" (81), de Mark Rydell, apenas veio confirmá-la, com mais de 70 anos, como grande dama do cinema americano. Na verdade, Hepburn triunfara sobre a máquina hollywoodiana, diante de quem ousara ser independente desde os anos 30, e sobre os preconceitos do público, a quem no fundo Hollywood representava. Mostrara-se capaz de interpretar tanto dramas como comédias e tragédias. Impusera aquilo que para ela era indispensável para se tornar uma estrela: a personalidade forte. (Inácio Araújo)

Um empurrão nefasto no autor de “Ponteio”

Por Camila Seta, Suellen Campos e Gustavo Medeiros (Editoria de Música)

Edu Lobo, um dos músicos mais talentosos de sua geração, tinha 25 anos em 1968 e tinha acabado de compor, em 1967, dois de seus maiores sucessos, “Pra dizer adeus” e “Ponteio”. Em 1968, compôs, entre muitas outras canções, “Memórias de Marta Sare”, com Gianfrancesco Guarnieri. Edu morava no Rio e fazia sucesso com músicas que traziam sons de um Brasil plural que se orgulhava de ser Brasil. Criou-se nas rodas das casas de portas abertas de grandes compositores como Tom Jobim, Luiz Eça, Vinicius de Moraes, Carlos Lyra. Foi à Passeata dos Cem Mil, emocionou-se com os discursos do psicanalista Helio Pellegrino e de Vladimir Palmeira. Já naquela época, pensava em sair do Brasil para estudar música. A fama como cantor não era o que perseguia. Preferia ser compositor, entender mais a língua musical para se comunicar melhor com os parceiros e arranjadores. Mesmo com as minas explosivas da censura pós-golpe militar, até 1968 o trabalho prosseguia com dignidade. Mas um acontecimento nefasto o afastou dos amigos: com a decretação do Al-5, ele foi embora para os Estados Unidos.

“O Al-5, imposto em dezembro de 1968, foi definitivamente o que acabou me empurrando para fora do Brasil no ano seguinte. Eu já estava pensando em sair para estudar, por isso, sem dúvida, foi um belo pretexto. Sempre tive ligações fortes com o Brasil e morar fora era complicado para mim. Então, em 1969, saí daqui para me apresentar no Midem, na França, com a Elis [Regina], e na volta passei pelos Estados Unidos. Preferi Los Angeles a Nova York, talvez por causa do sol, por ser um pouco menos diferente da minha terra.”

Antes do Al-5, a gente tinha uma certa liberdade, apesar da ditadura. Tanto que compus as músicas do Arena conta Zumbi, com o [Giangrancesco], e o conteúdo de cunho social das letras era bem explícito, sem disfarce. Uma vez fui intimado a depor e me perguntaram muito sobre o Arena.

Depois do Al-5, perdeu-se muita coisa na área da cultura por causa das proibições. Músicas, filmes, peças eram cortados ou proibidos. Lembro-me de um episódio engraçado. Duas músicas minhas foram mandas para os censores, como tínhamos que fazer, e voltaram censuradas. Eram ‘Casa forte’ e ‘Zanzibar’. Nenhuma das duas tem letra.”

Edu voltou de Los Angeles dois anos depois. Decidiu que retornaria para o Brasil quando passou por aqui vindo de uma turnê no Japão. Reviu os amigos na casa do pai, Fernando Lobo, e naquela noite se decidiu.

“Minha música depende muito dessas conversas, desses encontros com os amigos, os outros músicos. Na volta já não era a mesma coisa, mas ainda assim preferia estar aqui. Naqueles tempos, a gente queria mudar o mundo. Não sei se sobrou alguma coisa daquele espírito. A chamada musica de protesto se perdeu. Mas acho que foi assim no mundo inteiro. Não vejo herança daquilo. Hoje em dia se aposta na banalidade.”

sábado, 14 de junho de 2008

Tabu Santos x Corinthians

Por Gustavo Medeiros e Renata Brazil (Editoria de Esportes)

- Futebol

No dia 6 de março, o estádio do Pacaembu foi palco de uma das partidas mais emocionantes da história do clube.

Até então, o Corinthians já estava 11 anos e 22 partidas sem ganhar do Santos. Um tabu que vinha desde os 3 a 3 em 1957, quando o Timão conquistou a Taça dos Invictos e jogou pela primeira vez contra o Rei Pelé.

Contando com os novos reforços Paulo Borges, Buião e Eduardo, além do técnico Lula, o Corinthians entrou em campo determinado e pronto para passar pelo difícil, até então imbatível Santos de Pelé. No primeiro tempo, o jogo terminou empatado. O grande destaque foi o zagueiro Luis Carlos, que fez uma marcação implacável no Rei.

No segundo tempo, o Corinthians começa pressionando e Rivelino chuta uma bola na trave. Logo depois, aos 13 minutos, Paulo Borges faz 1 a 0, após uma tabela com Flávio. Melhor em campo, o Timão segue firme em busca do objetivo. Aos 31 minutos, Rivelino lança Flávio, que aproveita a chance e aumenta: 2 a 0. Depois disso, o time só esperou o juiz encerrar para poder comemorar. Fim do tabu.

A torcida invadiu o campo e carregou os heróis como se eles tivessem conquistado um título, gritando e cantando: "Com Pelé, Com Edu, nós quebramos o tabu" e “um, dois, três, o Santos é freguês”.

Veja o depoimento de Paulo Borges sobre a partida: “ Foi a melhor partida da minha vida. O Pacaembu estava lotado e todos esperavam pelo fim do tabu de 11 anos. Jogamos muito bem e passamos com sufoco. No segundo tempo, fiz 1 a 0 com um belo chute pela esquerda. Depois, o Flávio aumentou. Eles puseram duas bolas na trave e nos pressionaram muito, mas conseguimos. Nossa festa foi até de manhã e eu fiquei vendo o teipe do jogo lá no Parque.” O Corinthians ficou 11 anos sem ganhar do Santos. O tabu, de 22 jogos, só caiu na noite de 06/03/1968, com uma vitória por 2 x 0, com gols de Paulo Borges e Flávio.

O Santos entrou em campo com: Cláudio, Carlos Alberto Torres, Ramos Delgado, Joel, Rildo, Lima, Negreiros, Kaneko, Toninho Guerreiro, Edu e Pelé. Já o Corinthians entrou com: Diogo, Osvaldo Cunha, Ditão, Luis Carlos, Maciel, Edson Cegonha, Rivelino, Buião, Paulo Borges, Flávio e Eduardo.

1968 – 2008: o movimento estudantil ontem e hoje

por Thatyana Freitas (Editoria de Política)

Ao lado do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), na Ilha da Cidade Universitária, uma faixa chama a atenção daqueles que passam no local. Nela está escrito: “Maio de 1968 – Maio de 2008: Os estudantes não vão se calar. Melhorias para os HUs já! Mais verbas para a saúde e educação”. Trata-se de um protesto dos estudantes de medicina das quatro universidades públicas do Rio de Janeiro: UERJ, UNIRIO, UFRJ e UFF.

Faixas de protesto dos estudantes de medicina da UERJ, UNIRIO, UFRJ e UFF próximo ao HUCFF

No dia 30 de maio, estudantes de medicina destas faculdades realizaram manifestações simultâneas em diversos pontos da cidade do Rio de Janeiro para contestar a falta de repasse de verbas por parte do governo para os hospitais universitários e protestar contra o abandono em que se encontram estes hospitais.

Cerca de 500 estudantes de medicina da UFRJ, vestidos com seus jalecos brancos, sentaram-se em duas faixas da Linha Vermelha, sentido baixada, na altura do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, conhecido como Hospital do Fundão, e bloquearam a via por cerca de meia hora. A polícia soltou bombas de gás lacrimogêneo e repreendeu os manifestantes. Simultaneamente, alunos da UNIRIO partiram do Hospital Universitário Gafreé e Guinle, na Tijuca, em direção ao Hospital Universitário Pedro Ernesto, em Vila Isabel, onde realizaram nova manifestação em defesa dos hospitais universitários.

No dia 20 do mesmo mês, alunos de medicina da UFF haviam realizado uma manifestação em frente ao Hospital Universitário Antônio Pedro, em Niterói. O objetivo da manifestação era o mesmo: exigir melhorias nas condições de trabalho nos hospitais universitários e na educação superior.

Nas mensagens de protesto, os estudantes fazem referência ao movimento estudantil de 1968, que representou o auge do movimento estudantil brasileiro.

Naquele ano, explodem em vários países as manifestações estudantis. Em diversos lugares do mundo os jovens estudantes lutam contra guerras, injustiças sociais, buscam liberdade de expressão etc. No Brasil, em meio ao auge da violência do regime militar, lutam também pela educação, contra o autoritarismo dos militares, pela reforma agrária, por melhores condições de saúde, moradia etc.

Pelos livros, fotografias e artigos jornalísticos da época vemos que a atuação dos estudantes foi bastante representativa naquele período. Só para mencionar, o maior movimento de contestação ao Regime Militar, em 1968, a Passeata dos Cem mil, foi capitaneada, entre outros segmentos da população, pelos estudantes. Fora este acontecimento, houve ainda o Congresso da UNE, em Ibiúna, que terminou em violenta repressão policial, entre outras tantas mobilizações.

Durante os anos de chumbo, os militares colocaram as entidades estudantis na ilegalidade. Estudantes foram perseguidos e presos, muitos nunca foram encontrados.

Em 1984, os estudantes assumem um papel importante no movimento das Diretas Já!, cujo objetivo era a volta das eleições diretas para presidente no Brasil, uma proposta de retorno da democracia. O congresso votou a favor das eleições indiretas e Tancredo Neves foi nomeado presidente para o próximo mandato (a partir de 1985). Ficou decidido que eleições de 1989 seriam diretas.

Assim se fez. Depois de mais de três décadas de eleições indiretas Fernando Collor de Melo derrota nas urnas o seu adversário, o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e é eleito Presidente da República. Por conta da corrupção em seu governo, o presidente eleito não chegou a concluir o mandato de quatro anos. A população mais uma vez foi às ruas, desta vez para lutar pelo Impeachment do então Presidente. O movimento teve forte adesão dos estudantes que ficaram conhecidos como Caras Pintadas, pois pintavam seus rostos em ato de protesto. Collor tem seu mandato cassado em 1992.

Os períodos mencionados acima foram marcos representativos da atuação dos estudantes no Brasil. Outras mobilizações foram realizadas, em outras épocas. Muitas delas não alcançaram grandes resultados concretos.

Recentemente os estudantes foram às ruas em diversas ocasiões brigar pelo passe livre, ocuparam reitorias em protestos contra o desvio de verbas e contra o Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), provocaram inclusive o afastamento do reitor de uma das maiores universidades públicas do País. Movimentos como estes e como aquele realizado pelos estudantes de medicina continuam a acontecer, mas faltam ainda atuações mais incisivas em prol dos interesses de toda a sociedade, ultrapassando a seara da educação.

O retorno ao passado suscita reflexões importantes a respeito do que temos feito hoje. Esta é uma boa oportunidade para pensar sobre o assunto. Pelo que temos lutado e o que temos, de fato, conseguido? Reflita você também.

A vaia em “Sabiá” e a torcida por Vandré – O exílio e o protesto

Por Camila Seta, Suellen Campos e Renata Brazil (Editoria de Música)

O tempo que se vivia em 1968 era m tempo de paixões. Pela política, contra a ditadura, pela arte. Os festivais de música acabavam se transformando em cenário de torcidas apaixonadas. Assim foi com o Festival Internacional da Canção (FIC), realizado anualmente de 1966 a 1972, no Maracanãzinho, no Rio. Era dividido em duas fases, nacional e internacional. A canção classificada em primeiro lugar na fase nacional representava o Brasil na fase internacional, disputando com representantes de outros países o prêmio Galo de Ouro, desenhado por Ziraldo. No FIC, Hilton Gomes, apresentador oficial, imortalizou a frase “Boa sorte, maestro!” e Erlon Chaves compôs o “Hino de FIC”, tema de abertura do festival.

No III FIC, que aconteceu em setembro e outubro de 1968, duas canções disputavam o prêmio nacional: “Sabiá”, de Tom Jobim e Chico Buarque, e “Pra não dizer que não falei de flores” (“Caminhando”), de Geraldo Vandré. Com uma letra explosiva em pleno regime militar, que incitava o povo a reagir e não esperar “acontecer” (“Quem sabe faz a hora/ Não espera acontecer”), Geraldo Vandré, sozinho no palco e de violão em punho, arrebatou um Maracanãzinho ávido por se pronunciar contra a ditadura e a falta de liberdade. “Sabiá”, mais lírica e menos impactante, interpretada por Cynara e Cybele, era uma música que falava do exílio a que muitos artistas e intelectuais estavam sendo (e iriam ser num futuro próximo) submetidos, e foi recebida como uma canção de amor. Também caiu no gosto do público, que se dividiu entre as duas, com torcidas. Mas quando o resultado final foi apresentado, uma boa parte vaiou a bela e sofisticada composição de Chico e Tom, achando que a música de Vandré só não ganhara porque criticava abertamente a ditadura militar. Chico e Tom tiveram de agüentar a chuva de vaias e Vandré saiu consagrado do Maracanãzinho, apesar do segundo lugar.

Apenas duas canções brasileiras foram contempladas com o Galo de Ouro: “Sabiá”, vencedora em 1968, e “Cantiga por Luciana”, de Edmundo Souto e Pulinho Tapajós, interpretada por Evinha e vencedora em 1969 do IV FIC.

Vencedoras do III Festival Internacional da Canção – 1968

“Sabiá” (Tom Jobim e Chico Buarque, com Cynara e Cybele).

“Pra não dizer que não falei de flores (“Caminhando”) – (Geraldo Vandré, com Geraldo Vandré).

“Andança” (Edmundo Souto, Danilo Caymmi e Paulinho Tajós, com Beth Carvalho e Golden Boys).

“Passaralha” (Edino Krieger, com o Grupo 004).

“Dia de vitória” (Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle, com Marcos Valle).

sexta-feira, 13 de junho de 2008

A origem literária do ano de 1968

Por Maria Laura (Editoria de Literatura)

A geração de 68 traz consigo marcas de diversas searas. O ano manifesto foi a explosão diante do que se viu em longos anos: a descolonização do continente africano, a crescente tensão da Guerra Fria, o aumento da dinâmica dos movimentos identitários da sociedade civil. Resgatando as origens de 1968, encontramos na literatura dos anos de 1950 um importante fator: o Novo Romance.

Surgido na França e que se estende pela Europa pós-guerra e EUA, o movimento literário pelo Novo Romance provoca uma ruptura no modo de construção do texto. Nathalie Sarraute, Michel Butor, Alain Robbe-Grillet, Claude Simon são alguns dos nomes do movimento. O historiador André Sena, professor de História Contemporânea da UERJ, aponta essa geração como a que vai para as ruas com os estudantes em 1968. “Esses autores vão pensar a expressão literária, que será completamente posta à público em 1968, a partir da descrição dos objetos, de uma experiência não mais estética, mas sinestésica”.

As características do Novo Romance são a desconstrução da narrativa psicológica, do personagem, fragmentações das identidades da narrativa e da sua linearidade. Essa nova escrita não agradou ao público e os autores foram chamados até de terroristas. “A idéia desse movimento que vai gerar, literariamente, o pensamento de 68, o coração do pensamento desses autores é criar uma narrativa capaz de construir o mundo e não uma narrativa que comece com o mundo já dado”, revela Sena.

“A estrada de Flandres” (1960), “História” (1967) ambos de Claude Simon, “Entre a vida e a morte” (1968) de Nathalie Sarraute, “L’Emplois du temps” de Michel Butor são algumas das publicações do movimento. No Brasil, Clarice Lispector dominou com maestria o romance cheio de divagações e fragmentações. “A paixão segundo G.H.” (1964) e “Água Viva” (1972) são excelentes exemplos da desconstrução nova romanesca.

A história do cinema em uma sociedade racista norte-americana

Por Giosete Vieira (Editoria de Cinema)

Adivinhe quem vem para jantar foi lançado em 1967 nos EUA e assistido em 1968 quando a luta pelos direitos civis agitava a América. Apesar de a violência racial correr solta do lado de fora dos cinemas na época do lançamento, nessa comédia romântica tudo se resolve com muita conversa. Algumas idéias sustentam o enredo de forma bem direta como a de que há negros com currículos impecáveis nos EUA; há brancos liberais e negros racistas por lá; o racismo aflora em situações limite nas melhores famílias; alguns negros não querem integração com os brancos e quebrar tabus é para os fortes ou muito apaixonados. Ah, como sempre, o amor é lindo e transforma o mundo.

O filme gira em torno do desconfortável jantar em que a filha de um rico e liberal proprietário de um jornal de São Francisco e sua mulher são confrontados pela filha Joanna de 23 anos, onde foi criada ouvindo os pais combaterem qualquer tipo de discriminação, principalmente no que tange ao relacionamento entre brancos e negros. Quando ela leva seu namorado (um médico negro) e os pais dele para jantar (e anunciar o casamento). A hipocrisia do discurso liberal e as contradições da racista sociedade norte-americana explodem por todos os lados, em interpretações memoráveis.

O casal de classe média americana precisa reavaliar seus princípios quando descobre que sua filha está namorando um rapaz negro inteligente e de promissora carreira. Dirigido por Stanley Kramer (Julgamento em Nurenberg) e com Spencer Tracy, Sidney Poitier e Katharine Hepburn no elenco. Vencedor de dois prêmios Oscar.

John (Sidney Poitier) e Joanna (Katharine Hougthon) se conheceram durante uma viagem, em pouco tempo se apaixonaram irreversivelmente e agora querem se casar o mais breve possível. O filme começa com o casal de pombinhos chegando de surpresa à casa da moça. Ela quer apresentar o novo namorado aos pais e falar com eles sobre a idéia do casamento. Joanna é uma moça refinada e jovial e John um médico viúvo com um currículo invejável. Os pais da moça são pessoas instruídas, bem sucedidas e liberais. Só há um probleminha que ninguém quer mencionar com todas as letras: ela é branca e ele, negro.

De férias, no Havaí, ela conhece e se apaixona pelo Dr. John Wade Prentice, médico negro, dez anos mais velho que ela, sendo por ele correspondido. Ao concluir uma série de palestras na Universidade local, o médico deve retornar à Genebra, onde é diretor da Organização Mundial de Saúde. Decidida a se casar com ele, Joanna pede-lhe que, em sua viagem de volta à Suíça, ele passe um dia na Califórnia a fim de conhecer seus pais. Assim, os dois viajam juntos para São Francisco. Do aeroporto, antes de seguirem para a casa de Joanna, a jovem decide passar pela Galeria de Arte da mãe, mas não a encontra. A Sra. Hilary St. George, que trabalha com Christina, mostra-se curiosa em relação ao jovem casal.

Uma vez em casa, Tillie, empregada negra da família há mais de 20 anos, recebe mal o médico por achar que, sendo de cor, não é digno de Joanna. Christina chega, logo a seguir e, após se sentir chocada com a notícia inesperada, recupera-se e passa a apoiar a filha, principalmente por vê-la tão feliz. Na ocasião, a jovem lhe explica que John deve seguir no dia seguinte para Nova York e, logo depois, para Genebra, enquanto ela deverá permanecer uma semana em São Francisco, antes de seguir para a Suíça a fim de se casar com ele.

O Sr. Drayton chega do jornal e também se sente chocado com a notícia. Embora se comporte de forma extremamente educada com o médico, não nega ser difícil para ele aceitar aquela situação. Pedindo licença, vai até seu escritório, de onde liga para o jornal e pede que levantem nos arquivos todas as informações sobre o médico. Minutos depois, é informado que o Dr. John Prentice é um homem de fama mundial, formado com louvor pela Universidade Johns Hopkins em 1954, tendo lecionado na Universidade de Yale e, em seguida, sido professor de medicina tropical, em Londres, antes de assumir uma diretoria na OMS; do seu currículo, constam ainda a publicação de dois livros e uma lista imensa de monografias e homenagens; no que tange à sua vida pessoal, foi casado com Elizabeth Bowers, com quem teve um filho, mas ambos morreram em um acidente em 1959.

John procura os pais de Joanna, em particular, aos quais diz que, se não houver o consentimento deles, não haverá casamento, pois, embora ame demais a jovem, não quer ser responsável por um desentendimento na família, o que certamente a faria sofrer. Tal colocação deixa o Sr. Drayton sentindo-se ainda mais pressionado a tomar uma decisão em menos de um dia.

Enquanto isso, quando John se comunica com os pais, que residem em Los Angeles, para lhes informar que se acha em São Francisco de passagem para Genebra, Joanna toma o telefone e os convida para virem a São Francisco e jantarem em sua casa naquela noite.

Percebendo suas reais intenções, Christina a demite no ato. Logo a seguir, chega ao local monsenhor Mike Ryan, um dos maiores amigos da família. Ao tomar conhecimento da situação, fica muito feliz e passa a dar a maior força aos dois jovens.

Às 19 horas, o Senhor e a Sra. Prentice chegam para o jantar. A exemplo do que está ocorrendo com os pais de Joanna, a mãe de John apóia a decisão do filho, enquanto seu pai mostra-se ainda mais radical que o Sr. Drayton. Vários encontros se sucedem entre os diversos envolvidos: Christina e a Sra. Prentice; o Monsenhor e o Sr. Drayton; John e o pai; o Sr. Drayton e o Sr. Prentice; o Sr. Drayton e a Sra. Prentice.

Ao final, depois de reunir todos na sala de estar, inclusive a empregada Tillie, o Sr. Drayton, num discurso emocionante, faz uma análise perfeita da situação, mostrando principalmente os problemas e dificuldades que o jovem casal vai ter que enfrentar, junto à sociedade cheia de preconceitos, e dizendo que, mesmo assim, não pode deixar de apoiar a decisão da filha. Em seguida, convida todos a passarem para a sala de jantar.

Adhemar Ferreira da Silva – O primeiro bicampeão de ouro do Brasil

Por Marcus Azevedo (Editoria de Esportes)

O ano de 1968 foi importante na história do país. Nos Jogos Olímpicos de 1968 realizados na Cidade do México que tivemos uma conquista de medalha de bronze no atletismo. O responsável foi Adhemar Ferreira da Silva, um paulistano de 41 anos, vindo de uma família humilde no bairro da Casa Verde, capital paulistana. Porém a história deste atleta tem muito mais conquistas a serem lembradas.

Adhemar na época de atleta

Adhemar começou a competir oficialmente no ano de 1947, na categoria de salto em distância, no campeonato chamado Troféu Brasil onde conseguiu a marca de 13,05 m, marca que fez com que ele disputasse os Jogos olímpicos daquele ano, sediados em Londres. Nestes jogos, porém, conseguiu apenas o 14° lugar.

Nas olimpíadas seguintes em Helsinque no ano de 1952, que aconteceram na Finlândia, Adhemar já não era um total desconhecido, pois já havia conseguido o primeiro lugar nos Jogos Pan-americanos. Nestas olimpíadas ele já disputava na categoria de salto triplo e não imaginava conseguir grava seu nome como novo recordista mundial. O recorde até então era de 16 metros e num mesmo dia ele superou a marca por quatro vezes: 16,05 m, 16,09m, 16,12m e 16,22m. Com essa vitória foi dada ela primeira vez a famosa volta olímpica para agradecer e receber de perto os aplausos do público.

Adhemar nos jogos olímpicos de 1952

Quatro anos depois, novamente tivemos os jogos olímpicos sediados em Melbourne na Austrália, no ano de 1956. Dois dias antes de sua competição, Adhemar sofreu com uma forte dor de dente, que quase poria em risco seu desempenho, mas foi sanada com uma punção aplicada por um dentista. Neste ano seu salto atingiu a marca de 16,36m quando conseguiu o marco de ser o primeiro brasileiro bicampeão em jogos olímpicos.

Disputou outros jogos olímpico e como já citado, na edição da Cidade do México, conseguiu apenas o 14º lugar. Um pouco mais tarde, no ano de 1960 o atleta contraiu tuberculose. Quando isto aconteceu, Adhemar já se encontrava prestes a participar das olimpíadas de Roma em que seria o porta-bandeira da delegação, mas devido a seqüelas da tuberculose e diagnósticos médicos não passou das eliminatórias.

Além das conquistas olímpicas Adhemar é pentacampeão sulamericano e tricampeão pan-americano e campeão luso-brasileiro além de outros títulos internacionais.

Após tantas conquistas nosso atleta veio a falecer de uma parada cardíaca em 12 de janeiro de 2001, aos 74 anos de idade.

Outros feitos de nosso atleta

Além de atuar na área dos esportes Adhemar circulava por outros setores da sociedade. Cursou escultura na Escola Técnica Federal de São Paulo, educação física na Escola do Exército, direito na Universidade do Brasil e Relações Públicas na Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero. Depois disso foi a vez de entrar em cena literalmente. No ano de 1956 ele atuou na peça Orfeu da Conceição, de Vinicius de Moraes e três anos depois foi a hora de aparecer nas telonas. O atleta multi-graduado atuou no filme franco-ítalo-brasileiro Orfeu do carnaval, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro de 1959. Nos anos de 1964 a 1967 foi adido da Embaixada Brasileira na Nigéria.

Realmente se comprova com exemplos com este, que os grandes nomes da história do país não se atém somente ao que lhes é comum, o pensamento presente entre essas pessoas é sempre o de auto superação.

Adhemar nos dias de hoje